quinta-feira, 21 de junho de 2007



Profissão Cinema

Charlie Kaufman, Michel Gondry e Brilho Eterno de Uma Mente sem Lembranças.

Texto por: Rodrigo Moreira

“Feliz é o destino da vestal, esquecendo o mundo e sendo por ele esquecida"
Brilho eterno de uma mente sem lembranças.
Toda prece é ouvida,toda graça alcançada.”


Alexander Pope, o autor dessas linhas era um gênio em sua época. Grande poeta Iluminista, curvava linhas sobre as problemáticas da sociedade e ainda tinha tempo para escrever historias de amor. Em seu extenso poema de 366 versos “Eloisa to Abelard”. Alexander narra a historia real de um amor que foi além da vida.
Eloísa, nossa bela jovem, tinha apenas 17 anos quando conheceu Abelard . O rapaz que já tinha 37 anos encontrava-se hospedado na casa do Tio de Eloisa. Foi amor à primeira vista. Porem, ele era um homem da igreja e ambos sabiam que não poderiam viver esse amor explicitamente. O casal passa a se encontrar escondido e cresce entre eles um amor inimaginável. Só que um belo dia o Tio de Eloísa descobre a trama e ordena que Abelard seja capado. O amor do casal que transcende as barreiras terrestres não acaba e eles continuam a se corresponder por meio de cartas ate o fim de suas vidas.
O poema em si e subdividido em varias partes, afinal e uma historia bem extensa, e essas frases que vocês leram no inicio fazem parte da carta de Eloísa para Abelard.
Caso queira continuar mergulhando nesse fantástico poema e saber mais sobre essa trágica historia clique aqui. (em inglês)
Agora, o que vocês acham de transformar essas três belas frases e um dos roteiros mais fantásticos já feitos? Bom, foi o que o gênio Charlie Kaufman concebeu. A partir dessas três frases de Alexander Pope surgiu o roteiro de Brilho Eterno de Uma Mente sem Lembranças. Vamos Mergulhar um pouquinho na historia dessa maravilhosa obra de arte cinematográfica.

A Little Bit of History.

Charlie Kaufman nasceu dia 1 de Novembro de 1958, vem de uma família judaica de Nova York e pelo que me parece possui um Brilho Eterno em sua Mente.
Autor de roteiros totalmente fora do comum, Charlie Kaufman é hoje uma das personalidades mais influentes de Hollywood. Veja bem o porquê. Atualmente os roteiros de filmes geralmente são escritos por equipes coletivas o que torna o roteiro mais diversificado mais fácil de engolir e consequentemente de vender. Charlie escreve seus roteiros só. Alias e um dos poucos roteiristas atuais que trabalham dessa forma e quem assistiu algum filme de sua autoria sabe o quão impar são suas composições.

Charlie desde que ingressou na faculdade começou a escrever. Tinha a idéia que escrevendo se tornaria diretor, acabou se tornando em minha opinião, o melhor argumentista da atualidade. Talvez você não de muita importância para o roteiro, mesmo porque não e todo mundo que assiste um filme e se interessa por saber quem escreveu ou dirigiu, mas e sempre bom saber aquilo que esta por trás do que estamos vendo principalmente quando você começa a descobrir o modo que o filme foi concebido.

As idéias de Kaufman passeiam livremente pelos mais diversos campos da dialética mental. Roteiros como “A Natureza Quase Humana”, ““ Adaptação” e ‘Quero ser John Malkovich” são um verdadeiro “Freak Show” surreal misturando idéias palpáveis com viagens turbulentas através do inconsciente humano. Ver o nome de Kaufman estampado nos créditos de um filme pode às vezes soar mais importante que o próprio diretor tamanha credibilidade do autor. Visão essa que Charlie recusa. Para ele essa historia de creditar o mérito de um filme para apenas uma pessoa e balela. "O cinema é fruto de um enorme trabalho de colaboração", diz Kaufman.
Alguns itens sempre são muito presentes nos roteiros de Kaufman. Viagens Mentais, uma certa predominância do sexo feminino sobre o masculino e conflitos constantes do protagonista com si próprio, reflexo claro de uma parte da personalidade de Kaufman que acaba sendo carregada para o filme. Influenciado por mestres como Kafka, Beckett, Ionesco e Flanerry O` Connor não poderia sair algo mais díspar. A falta de explicações obvias sempre se tornam muito presentes em seus filmes o que torna necessária uma segunda sessão, para captar os pormenores e poder tentar mergulhar na sandice de Kaufman.
No roteiro de Brilho Eterno não foi diferente. A idéia bruta e oriunda de uma conversa do diretor Michel Gondry com seu amigo de épocas escolares, o artista francês, Pierre Bismuth em um café na Franca. Pierre, que na época estava com a idéia de enviar cartões a pessoas conhecidas dizendo que alguém que lhe fosse comum o havia apagado de sua mente. Mais tarde em 2004 ele lançou uma mostra intitulada - “Quelqu`un que je ne connais pás qui me rapelle quelqu`un que vous ne connaissez pas” (Alguém que eu não conheço e que me lembra alguém que você não conhece). Onde ele mostra imagens de pessoas em closes típicos remetendo uma plástica lembrança que temos das pessoas no dia-a-dia.
A Partir dessas brincadeiras ligadas a lembrança e ao esquecimento Kaufman produz para Gondry o roteiro de Brilho Eterno. Finalizado em 2003 ficou a cargo de outra mente maluca transformar a tinta em obra de Arte. Tímido e de uma imaginação digna de criança Michel Gondry, que vem da produção de clipes musicais, assina a direção desse fantástico filme.

Michel Gondry, 8 de Maio de 1963 em Versailles – Franca, consagrou-se no ramo musical. Se você esta a pensar que nunca assistiu algo feito pelas mãos de Gondry e esta pensando quem diabos será esse sujeito pode ser que esteja redondamente enganado. O diretor se destaca principalmente pela sua obra produzida ao lado da cantora islandesa Bjork que por sinal possui uma ótima relação com o diretor. Bjork ‘achou” Gondry logo no inicio de seu trabalho solo e desde então eles tem feito parcerias que combinam perfeitamente. Chega a ser praticamente uma pratica relação de marido e mulher de acordo com Gondry: - “Sempre tenho ciúmes quando Bjork trabalha com algum outro.
Ou quando vejo um clipe fantástico como Come to Daddy, de Aphex Twin... Mesmo se entendo Bjork, isso me deixa louco. Vejo nossa relação como à desses casais dos anos 70. O marido e a mulher fazem sexo com outros parceiros para preservar o casamento”.

O que levou Bjork a entrar em contato com Michel foi o material que ele produzia para sua própria banda. Isso mesmo, Michel Gondry era baterista de uma banda chamada Oui Oui, letras descompromissadas e clips visualmente artísticos fazem parte do enredo da banda. A produção própria de Michel Gondry narra seu inicio no fantástico mundo do cinema e o que vemos depois e a construção de um extenso currículo que inclui bandas como: Foo Fighters, Chemical Brothers, White Stripes, The Willowz, The Poliphonic Spree etc.

O inicio de Gondry no cinema não pode ser considerado tão promissor quanto sua carreira como diretor musical. A Natureza Quase Humana, roteirizado também por Kaufman, da o pontapé inicial as incursões de Gondry no Cinema. Porem, sem tanto sucesso na critica. O filme narra a historia de um cientista que possui uma retenção anal e se dedica na maior parte do seu tempo a ensinar bons modos a ratos brancos. O maluco se apaixona por uma escritora um tanto quanto estranha também que possui um excesso de pelos no corpo e os dois mergulham numa busca pelo desconhecido após encontrar um rapaz que ate então havia sido criado como um macaco. Aqui Kaufman e Gondry brincam com o que há de mais primitivo na natureza humana, eles absorvem a síntese animal que há dentro de nos e mostra que no fundo não passamos de animais domesticados.

O que vem depois disso e a idealização do que e em minha opinião a mais bela historia de amor já vista. Brilho Eterno de Uma Mente sem lembranças chega em 2004 às telinhas e mostra um Gondry solto e primoroso em seu trabalho. Os elementos artesanais continuam presentes e a abstenção de recursos digitalizados explicita. Na trama Joel Barish, interpretado por Jim Carrey, um tímido e introspectivo rapaz conhece Clementine Kruczynsky (Kate Winslet) em uma viagem a praia com seus amigos em um fim de semana. Eles se apaixonam namoram e um belo dia cansada do sofrimento e do desgaste causados pelo relacionamento Clementine busca uma clinica que oferece um exclusivo método de supressão de memória, onde você consegue apagar qualquer lembrança indesejável. Clementine como a maioria dos pacientes apaga Joel de sua memória e quando Joel descobre fica arrasado e tenta fazer o mesmo. Porem, durante o procedimento de exclusão de suas lembranças ele percebe que ainda ama Clementine. O que se segue e uma viagem por dentro da mente do personagem onde lutamos junto com ele para que todas as lembranças não sejam apagadas e ele possa acordar e voltar para sua amada.

Vencedor de melhor roteiro original no Oscar® 2005 esse filme marca o auge tanto na carreira de Kaufman quanto de Gondry, fora a maravilhosa atuação de Jim Carrey e Kate Winslet fantásticos em papeis que não fazem parte do seu universo comum.
Brilho Eterno se torna de longe a melhor colaboração feita em conjunto por Gondry e Kaufman,por enquanto, já que no ano passado Gondry lançou “The Science of Sleep” e Charlie Kaufman esta imbuído em seu novo projeto, intitulado Cinemadoque, onde atuara também como diretor executando sua primeira aventura no mundo da realização.
Se você não assistiu corra para a locadora mais próxima e alugue. Caso você já tenha assistido e gostado faca que nem eu a aguarde ansiosamente ate o próximo encontro de Charlie Kaufman e Michel Gondry.

Ate Mais!!!

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